Nuggebresa



O homem estava afobado. Tinha pedido uma pizza que não chegava nunca. Até que ela finalmente chegou depois de uma hora e meia de ansiedade e tensão. Babava como cachorro velho. Suava, tava calor pra caraio! De pijama, sem camisa, foi receber a entrega no portãozinho de casa. O entregador ficou meio pasmo e assustado ao perceber o estado de seu cliente, barbudo, sujo, desgrenhado e com um olhar ensandecido e vago ao mesmo tempo. Grunhiu um boa noite e pagou a pizza. Fechou a porta e abriu a caixa redonda, comendo em seguida o primeiro pedaço, sem ao menos ver o alimento em si. Enfiou tudo na boca quase engolindo sua própria mão numa fúria desregrada e pitoresca. Seus dedos ficaram lambuzados e com anéis de cebola caindo pra todo lado. Suas unhas estavam entupidas com resquícios de calabresa esmagada. No momento da primeira mordida, algumas fatias de calabresa caíram em seu pé descalço. Sentia uma leve ardência por entre os dedos engordurados. Calabresa na frieira. Que se foda! Agora o objetivo é acabar com essa pizza, nem que o mundo exploda e tudo vire um monte de merda incandescente! Esse era o objetivo. Não era um homem de metas. Sua vontade aplicava-se ao futuro imediato. Não planejava o que faria da sua vida, mas o que faria nas próximas horas ou o que comeria de janta. Esse era o sentido. O único sentido de se estar vivo. Foi comendo…
Um pouco antes de pedir a pizza, ele já havia comido uns aperitivos. Tinha uma caixinha de nuggets que estava apodrecendo no freezer. Iria usá-la. Por que não? Tinha uma dúvida cruel, cortante e quase certeira: e se não matasse a sua fome? (era quase uma certeza mesmo). De qualquer jeito, colocou a merda dos nuggetinhos no forno. Só tinha doze. Não dava pro gasto. Seu estômago riu de desdém. Ficou com raiva de sua impotência quanto ao Universo. Queria reclamar pros filhos da puta que cobravam caro por essa merda e faziam um produto ínfimo, sem gosto e em poucas quantidades. Malditos! Deviam queimar no inferno pela propaganda enganosa. Mata a sua fome e te regala! Regala o caralho! Bando de filho da puta! Não deu outra. Assou a merda, comeu em cinco minutos. Teve que pedir a pizza.
Agora já estava no quinto pedaço. O estômago tava gozando de uma boa refeição, mas já dava mostras de estufamento. Sexto. Sétimo. Só tinha mais unzinho. Não aguentava mais. Os nuggets batalhavam contra a massa recém-chegada. Era uma guerra sangrenta e ácida. Barulhenta. Borbulhenta. Bolhas de saliva misturada com molho de tomate formavam-se na sua goela. Queria arrotar, mas não conseguia. O pedacinho tava lá. Convidativo e traiçoeiro. Foda-se mais uma vez, vamos lá! Pegou e enfiou tudo na boca, sem nem mastigar direito. Pronto, o trabalho estava feito. O objetivo do dia fora cumprido. Respirou aliviado (apenas mentalmente), mas logo sentiu um revés atroz. Sentia como se tivesse um monstro em sua barriga. Dores abdominais tomaram conta do corpo todo. Ele virou um estômago gigante. Seus músculos tremiam. Não conseguia nem peidar. Por todo o seu corpo passavam calafrios e sua testa estava em chamas. Suava que nem um porco no rolete. O pior estava concretizando-se. A refeição era muito recente, não conseguiria aliviar-se com uma inocente cagada. Uma onda não identificada subia pelo esôfago. Sentiu um gosto azedo e familiar na língua. Não deu tempo de nada. Um jorro melado, grosso e massiforme brotou de sua boca com uma violência explosiva! Era como uma fonte infernal jorrando uma mistura feita com tudo o que há de mais podre na humanidade. Vomitou pra cima, de forma que o conteúdo voltou-se todo pra sua cara, nariz, olhos. Aspirava o gorfo. Lacrimejava. Estava no meio da sala, protagonizando uma cena que só o Diabo assistia. Por fim, o jorro acabou. A barriga desestufou. O homem caiu no chão, as costas grudaram-se ao produto interno bruto de suas entranhas, e adormeceu, ali mesmo, ao som da noite, satisfeita e eterna.

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