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Mostrando postagens de dezembro, 2023

A Morte do Punheteiro Viajante

  Ficava dias e mais dias em viagens intermináveis. Conheceu todo o país. E um pouco da América do Sul. Mas o que gostava mais era das cidadezinhas. Ernesto Gomes Magalhães Pinto era de uma rica família tradicional paulista, uma típica quatrocentona. Seu tataravô era fazendeiro, dono de imensas plantações de café. A família tinha mansão na Avenida Paulista, prédio no Rio e o caralho a quatro. Resumindo, a fortuna não acabava nunca. Acontece que, Ernesto era um vagabundo. Nunca quis cuidar dos negócios da família e nunca quis fazer nada da vida. Gostava mesmo era de gastar a gigantesca herança que possuía. Tinha um hábito particular muito peculiar. Não era só um hábito, na verdade comandava sua vida e era o objetivo de sua existência. Amava viajar. Em ônibus ou trens. Andava pelo país inteiro. Já tinha estado em todas as cidades do estado de SP. Até em pequenas vilas e lugarejos. Sentia uma excitação tão grande no ato de viajar, que não conseguia segurar-se, precisava aliviar su

Existencialidade

  Eu queria viver de baboseira. Escrever um monte de idiotices e ganhar salário. Num jornal ou periódico qualquer. Dizer bobagens instruídas ou pedantes mesmo. Tem de monte. Esses dias eu vi um colunista andando na rua. Ninguém sabia quem era, mas eu sabia. Tava meio disfarçado, com um boné e óculos de sol, mas eu o reconheci. Ele caminhava displicentemente, como se a vida fosse uma maravilha. Olhava ao redor, tudo lhe agradava. Agradecia a mulher que lhe vendia flores. Saiu com um buquê duma floricultura. Eu vi tudo isso. Vi tudo isso porque o segui. O segui desavergonhadamente, mas ele nem se deu conta, porque anda sem medo, confiante em sua vida segura e “plena”. Será que ele daria essas flores de presente? Que flores eram? Não conheço flores, não sei dizer. Eram amarelas. Só isso posso dizer. Deviam cheirar algo nesse sentido. O que cheira amarelo? Milho? Ouro? Mijo? Sei lá... e realmente não importa. Apenas divago. Mas não vago. Sigo. Seguir é uma ação direta. Uma ação pensa

Circundando as Férias

  Mais um dia de trabalho comum e normal. Heitor cansou de pensar. Sua mente divagava sobre o fim de semana. Estava perto das férias. Planejava ir com a família para um passeio na praia. Já tinha tudo escolhido: casa, número de dias, até as refeições. Sentou-se à mesa do escritório. Sua faina era ordinária mas pagava bem. Fazia a mesma coisa todos os dias, era tudo automático. Não precisava planejar, como nas férias. O trabalho seguia num movimento peristáltico infindável. Colado na cadeira, Heitor suava, mesmo com o ar condicionado no máximo. Empapuçado de um ano que já acabava. Ano ameaçador que, no fim, revelou-se como todos os outros, acabou rapidinho. Trocava mensagens com sua esposa, animada. As crianças já estavam de folga. A vida familiar era uma beleza clichezenta e nostálgica. Até quando durariam os feriados, festinhas de aniversário e fins de semana casuais? Quanto tempo restaria até esse porta-retratos rachar e desbotar? A dúvida sempre acompanhava Heitor. Sua vida