Ebola na Saia



Rezava a Deus para não ser verdade. Sua mente teimava e constantemente o lembrava da ameaça. Não poderia estar com ebola. O frenesi da mídia havia assustado tanto Evangelino que ele agora acreditava que contraíra ebola de alguma maneira indecifrável. Por quê? Por que Senhor Jesus?! Repetia ele noite e dia. Fazia tudo direitinho. Ia no culto. Rezava. Não bebia. Não consumia substâncias ilegais. Não tinha pensamentos impuros… Peraí, será que Deus estava punindo-o por causa daquele dia?! Não durou nem um minuto! Domingo, depois da celebração, estava ele à toa na saída na igreja. A uns passos dele, estava Jesuína, bela moça. Evangelino olhou por alguns segundos para suas nádegas protuberantes no saiote apertado. Eram redondas e voluptuosas. Emanavam uma essência divina, como um presente da Criação feito para a procriação. Sentiu um leve comichão nas calças, que logo virou um endurecimento concreto, levando um certo rubor às faces de Evangelino. Saiu correndo, sem dar explicações a ninguém. O evento foi todo esse e ponto final. Agora, o Senhor iria puni-lo pela sua indiscrição e falta de vergonha na calça. Com certeza teria mandado um enviado de Satã para entregar-lhe o invólucro do mal que iria arruinar-lhe a vida terrena e a eterna num piscar de olhos. Desconfiava que foi naquele dia, na lanchonete do Janjão. Pediu um x alguma coisa. Veio embrulhado no papelão típico de franquia, mas que não era franquia, e sim imitação de franquia. O lanche tava com um gosto esquisito. Nem frio, nem quente. Meio estranho. Na hora em que mastigava, lá pela metade do sanduíche, viu o fritadeiro olhá-lo com um desdém ímpar. Quase pôde enxergar uma risadinha de escárnio no canto de sua boca. Será que era impressão? Foi dormir com uma pulga que não deixava de pular e dava até cambalhotas atrás de sua orelha. No dia seguinte, viu uma notícia na tv. Era sobre a epidemia de ebola que estava assolando a África e amedrontando o Ocidente temente a Deus. Logo lembrou que o fritador de hambúrguer era um imigrante recém-chegado de Serra Leoa. Diziam que ele mexia com feitiçaria também. Não podia ser! Começou a sentir umas tonturas, umas dores cranianas. Cheio de febre, suava como um pastor tirador de Diabo. O corpo tremia embaixo da coberta. Assistia à tv que não parava de jorrar notícias sobre o ebola e sobre como a doença estava infiltrando-se no continente americano. Logo chegaria no Brasil, se já não tivesse chegado. Evangelino, apavorado, não conseguia nem rezar mais. Ficou uma semana de cama. Foi ao médico, que lhe disse não passar de uma gripe comum. Sei, pensou Evangelino, gripe comum… era ebola! Sim, era ebola e Cristo me salvou! Nunca mais terei pensamentos sujos. Nunca mais vou olhar pras costas da Jesuína! Isso foi um aviso de Jesus! Voltou a dormir tranquilo. Ia ao culto regularmente. Tudo tava bem sossegado. Só parou de ir na lanchonete do Janjão, o lanche nem era bom mesmo. Já tinha passado um mês do transtorno. Na saída do culto, viu Jesuína. Ela caminhava um pouco a sua frente. Balançava, rebolava comportadamente. O saiote capeta! De novo um comichão… Olha o ebola!

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Portais de Notícias

Fluição Desbaratada

A Morte do Punheteiro Viajante