Lombão



Lombão. Baita lombão! O lombão de porco estava na mesa e fazia o bêbado salivar como uma leitoa no cio. Ele via aquele lombão brilhante, cheio de um molho gosmeticamente convidativo. Já sentia o gosto só de imaginar a tenra carne derretendo-se em sua boca. Derretendo-se sim, isso mesmo, já que não era um lombo seco, clássico em sua mediocridade. Era um lombo feito magistralmente por uma véia que sabia cozinhar como ninguém. Uma véia que fazia pratos de sonho. As crianças da rua geralmente corriam atrás da pequena senhora, gritando pedidos culinários e cuspindo elogios às coxinhas profanamente gostosas que a véia fazia nas festinhas de igreja que animavam a pequenina cidade interiorana nos feriados, domingos santos ou casamentos gratinados. O bêbado já começava a sentir pontadas de fome em suas entranhas, sacudia-se como um sabujão infartado. O lombão, baita lombão, já era lendário. Seu Jeremias da tendinha dos come-comes e saltolhos sempre falava nesse afamado lombão. O bêbado ainda não havia provado o tal prato perfeito que nem Deus deixaria de comer por nada na Terra assim como no Céu. Mas estava lá, na mesa. Tão perto que as narinas abriam que nem olho de cachorro morto esbugalhado na estrada. Lá, lá. Tava numa travessa prateamente enfeitada com umas batatas derretentes fazendo a volta no lombo. Umas bordas que pareciam coroar a carne com uma auréola dourada, molhosa, fumegante e extasiante. As batatas pareciam ter vida e conversar umas com as outras “Olha que lombão, meu Deus, como tenho orgulho de estar aqui!” E parecia sozinho lá no meio da mesa, como se fosse único prato em tão caprichado manjar dos deuses e esfomeados, ignorando-se que lá tinha também um frango excluído, ínfimo e quase inodoro; um arroz mediano, de praxe, bem populesco; uma salada escondida, de um verde incógnito; um feijão nervoso pelo fato de nem terem notado que ele tinha pedacinhos de linguiça e courinho que em outras épocas daria o que falar. Lá estava lá, o lombão! Caramba, quando ia ser declarada a comilança?! Dali a minutos, mas parecia eternidade infernal, ou no mínimo, uma espera rotineira num purgatório purguento. O nervoso aumentava, precisava dum traguinho, só um. Rápido. Foi-lá, do outro lado do barracão, na parte difamada, no lado esquerdo. Pegou uma dosinha de cachaça. Virou. Hum, beleza, agora sim. Vamos ao lombão que deve tá servindo! Foi, quando chegou lá, na mesa, o lombão se fora.

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